17 de mar. de 2009

A excomunhão é uma benção.

Eu tentei ser excomungada oficialmente. Juro por Deus. Foi uma idéia de minha amiga Nina Lemos. Numa segunda-feira qualquer, não mais inquieta do que o normal, Nina entrou na redação da Tpm e, antes mesmo de pegar o café, me fez o convite: “Quer ser excomungada comigo?”. Era tentador, embora eu nunca tivesse pensado a respeito. “Claro”, respondi. E ela imediatamente começou a ligar para igrejas (assim com minúscula mesmo) para saber como fazer para se livrar da culpa de termos sido batizadas.

Pelo que me lembro, depois de muito tentar falar com um padre sem conseguir (eles são, naturalmente, muito ocupados) Nina encontrou uma boa alma que resolveu dedicar um tempo ao próximo – no caso, ela. Quando explicou o que queríamos e por que queríamos, o padre disse: “Ah, sua amiga é gay? Então ela já está automaticamente excomungada”.

E meu mundo caiu. “Mas eu quero um ritual de excomunhão! Eu pago!”, gritei. “Conforme-se, você não vai ter um”, respondeu Nina. “A Igreja já faz questão de não ter você em seus cadastros de almas”.

Nunca fiz o teste para saber se meu dinheiro seria ou não aceito pela igreja católica para que ela me excomungasse em um ritual. Um dia, talvez, tenha saco para entrar em uma igreja, superar o arrepio em meu corpo toda vez que entro em uma (sempre em respeito a algum amigo, ou amiga, que ainda usa o estabelecimento para casar) e abrir a carteira em nome da divina excomunhão. Por enquanto, me basta saber que já saí dessa. E pelo motivo mais nobre: ser quem sou.

Por que mesmo gostaria de fazer parte de uma organização em que estupradores são bem-vindos e homossexuais não? Valha-me deus.

Mas hoje minha revolta com o catolicismo já nem é tão grande. Acho que perdi o ímpeto para criticá-lo porque ele mesmo está tratando de descer ao inferno sozinho. É como aquele jogador que, de tão ruim, não precisa nem de marcador durante o jogo: esse, a natureza marca.

Na verdade, vibro todas as vezes que algum dos representantes da igreja católica dá declarações como a desse padre (bispo ou coisa que o valha. Não sei a respeito das fardas da instituição) pernambucano que disse que abortar era pior do que estuprar. Fico realmente feliz quando ouço uma estupidez desse nível. Feliz porque é bom ver a verdade vindo à tona – e pela boca de homem de batina. Aí, é melhor ainda. Parece que, finalmente, a natureza está tratando de marcar a igreja católica.

E começo a sonhar com o dia em que a humanidade alcançará um nível de desenvolvimento espiritual que permita a todos distinguir entre a declaração diabolicamente abobada de um padre e a justiça cósmica. Nesse dia, o catolicismo terá sido enterrado – e isso sim será divino.

Que a igreja fique com seus estupradores e pedófilos. Que os abrigue em seus altares de mármore, que dedique a eles missas e liturgias em latim. Enquanto isso, nós, os que fazem sexo sem querer reproduzir, os que usam camisinha, os que amam pessoas do mesmo sexo, os que não vão à missa nem amarrados, os que acham que uma menina de nove anos pode e deve tirar o feto que foi resultado de um estupro feito por quem deveria protegê-la ficamos do lado de cá.

Aliás, ficamos do mesmo lado daqueles que comem moluscos (no Levíticos 11:10 está escrito que eles, os que comem o molusco, são uma abominação), dos que trabalham aos sábados (o Êxodos 21:7 diz quem trabalha aos sábados deve ser morto e talvez a igreja, ocupada com tantas ações judiciais movidas por vítimas da pedofilia de seus padres, esteja se esquecendo de matar esses caras) e dos que aparam a barba (que, segundo determinação do mesmo livro, também devem ser assassinados). É nóis.

Porque tem ainda o seguinte. Se amanhã um maluco decidir matar alguém que não aparou a barba ou que trabalhou no sábado, esse cara está automaticamente absolvido pela igreja católica, mãos dadas com o pedófilo e com o estuprador. É por isso que eu oro: incluam-me fora desse time, pelo amor de Deus.

Milly Lacombe


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